sexta-feira, dezembro 31, 2010

Ainda o Natal...

Há dias, numa fila bastante grande dos correios, tive oportunidade de folhear um dos muitos livros à venda na estação (já repararam que nos CTT se vende quase tudo...menos selos?).
Escolhi o último livro de Isabel Stilwell - QUEM TEM MEDO DO LOBO MAU ? -  e abri ao acaso. Uma crónica sobre o Natal. Gostei. Em casa procurei no site do Destak e encontrei-a. Data de 14.12.2007.
Aqui vai ela. Para fechar o ano de 2010.

PARA AQUELES QUE ODEIAM O NATAL

É suposto andarmos aos saltinhos pelas ruas, a cantar cânticos de Natal, espalhando alegria e caramelos pelas crianças, à procura dos presentes mais originais e personalizados, fazendo embrulhos cheios de laços complicados e abraçando todos os estranhos que encontramos pelo caminho.
O politicamente correcto tem destas coisas, e as generalizações não lhe ficam atrás. Para muitas pessoas o Natal é mesmo uma época de festa e boa disposição, em que se corta com a rotina e se repetem rituais que dão imenso sentido à sua existência. São aqueles, dizem os psicólogos, que tiveram uma infância feliz e experiências suficientemente gratificantes, para as desejarem não só repetir como passar à geração seguinte, a filhos e depois a netos. Em cada gesto há uma história, desde o musgo, que foi sempre apanhado em família, até à massa das filhoses, que se preparou ancestralmente daquela maneira.

Mas depois há os outros, e as estatisticas dizem que são muitos, que se sentem francamente deprimidos perante esta agitação colectiva. Em lugar de se sentirem felizes, sentem-se tristes, em vez de estarem a pulsar de energia, só têm vontade de ficar na cama sob o edredão, e deixar esta " quadra " passar, e o mais depressa possível. O Natal confronta-os com a família ideal, com um pai e uma mãe felizes com o seu filho perfeito, acolhido pelos anjos, visitado pelos pastores, a criança centro de todas as atenções, que provavelmente nunca tiveram a oportunidade de ser. Podem ter memórias tristes destes dias, em que a crise lá em casa estalava invariavelmente, em que sentiam atirados por um pai contra uma mãe, ou em que pura e simplesmente assistiam de longe ao Natal convencional dos outros, enquanto eles permaneciam ausentes, no sentido literal ou figurado. Mas também é possivel que lamentem o que perderam, porque era tão bom e nunca mais foi como a memória idealizada que construiram.. Ou, tão ou mais duro ainda, perderam entretanto as figuras do seu " presépio " pessoal, e não encontraram nas voltas que deram pelo mundo ninguém que fizesse as suas vezes.

O pior é que aqueles que odeiam o Natal, e se sentem mais em baixo nesta época, são olhados como desmancha-prazeres. A tristeza e a depressão são doenças altamente contagiosas, e é quase um instinto de defesa que o resto do clã - profissional ou familiar - marginalize aqueles que, não conseguindo entrar na festa, lhes lembram todas as angústias que tanto se esforçam por esquecer. Sozinhos e isolados, com a sensação de que sofrem de um mal só seu, porque todos os outros parecem tão contentes, não podem mesmo deixar de detestar tudo e todos que transportam aquela alegria que se lhes torna dolorosamente insuportável.

O final do ano, mesmo aqui ao lado, também não ajuda, sobretudo se por temperamento se gosta de fazer balanços. Devo ficar ou ir embora? O que é que consegui no ano que passou que se visse? Quando é que vou sair desta mediocridade, acabar esta relação, mudar de emprego, ter a coragem de começar tudo de novo? As perguntas são tantas como as pessoas, mas pôr tudo em causa pode ser carga a mais para a nossa carroça.

Então, e o que fazer? Para já, para já, aconselham os especialistas, aceitar o que sente. Não lhe apetece este ano brincar ao Natal, então não brinque - procure um Natal alternativo, parta para as Bahamas, onde as palmeiras e o sol lhe trazem menos memórias. Se é mesmo só esta data que o deprime, aceite que se calhar não há muita volta a dar, mas se o que acontece é que sente deprimido há muito tempo, e este é apenas o pico do seu mal-estar, então encha-se de coragem e procure ajuda. Um psicoterapeuta pode ajudá-lo a identificar essas feridas no passado - ou no presente - que lhe tornam impossivel andar com a vida para a frente. Ofereça a si mesmo essa terapia como presente de Natal. Pode ser o primeiro passo para uma segunda oportunidade...

Isabel Stilwell


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1 Comentários:

Às sábado, 01 janeiro, 2011 , Blogger Maria disse...

Já pelo menos há cinco anos que o meu natal e passagem de ano não eram tão maus como o foram este ano, por isso revejo-me nessa segunda e imensa camada de pessoas que só desejam é que esta época passe depressa. Sempre gostei daquilo que este período tem de mágico e infantil: as luzes, as árvores coloridas - o puro imaginário infantil como me contava um velho livro da minha infância que ainda guardo.
Mas afinal ... é tudo um bluff e eu não acredito no pai natal!

 

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